Brasil já enfrenta impactos das mudanças climáticas, diz relatório da ONU

03/03/2022

O IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU) lançou nesta semana o documento mais completo já feito sobre os impactos da crise do clima. O texto tem dois diferenciais em relação a outros relatórios do IPCC. O primeiro é não tratar tanto do futuro, mas dos impactos que já ocorrem em um mundo que está, por enquanto, 1,1°C mais quente do que antes da revolução industrial. Outra novidade é a análise dos impactos de eventos combinados, como quebras de safras simultâneas em diferentes regiões do mundo.

O conjunto de impactos para o Brasil (leia um resumo aqui) terá efeitos devastadores para a economia. Segundo o IPCC, o PIB per capita do país já é 13,5% menor desde 1991 do que seria sem o aquecimento causado pelas atividades humanas. E a economia brasileira está entre as mais expostas aos impactos do clima em outros países, em decorrência, por exemplo, de colapsos nas cadeias de fornecimento globais.

Insegurança alimentar

A diminuição na produção de alimentos no Brasil é um dos principais alertas do documento. De acordo com um estudo citado pelo relatório, a safra de milho pode cair 71% até o final do século no Cerrado se as emissões continuarem a aumentar e 38% se as emissões fossem reduzidas muito rapidamente. A probabilidade de perda de 10% ou mais da safra em vários lugares do mundo em um mesmo ano aumenta para 86% no cenário de emissões em alta, indica outro estudo citado.

Bovinos e suínos, raramente expostos a estresse térmico no Brasil, estarão sob risco no futuro em várias partes do país durante quase todo o ano se as emissões continuarem a subir, a exemplo do que já está acontecendo com a produção de aves.

Neste cenário, a acidificação e o aquecimento do mar se intensificariam ao ponto de extinguir a produção de crustáceos e moluscos no país entre 2050-2070. O aumento das emissões também reduzirá a produção de peixes em 36% neste mesmo período em relação ao previsto para 2030-2050.

Impactos na Amazônia

As áreas do Nordeste sujeitas à seca seguirão crescendo em um cenário de emissões mais altas, com a previsão de que as chuvas diminuam 22% neste século na região. As secas se tornarão mais frequentes também no sul da Amazônia, reduzindo a vazão na bacia do Tapajós em 27% neste século e em 53% na bacia do Araguaia-Tocantins. Ao mesmo tempo, Acre, Rondônia, Sul do Amazonas e Pará são as principais regiões onde haverá aumento de inundações frequentes ou extremas.

"O relatório do IPCC expõe que a vida humana está em perigo e a importância de começarmos a nos adaptar", afirma Walela Txai Suruí, fundadora do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia. "A Amazônia será um dos locais mais atingidos pelo aumento da temperatura, e dentro dos territórios indígenas isso está sendo sentido. Nas últimas chuvas tivemos pontes levadas pela água e estradas que dão acesso às aldeias alagadas."

"As informações que estão sendo apresentadas pelo IPCC demonstram tudo aquilo que, assim como os cientistas, nós, os Povos Indígenas, já vínhamos alertando há um bom tempo", afirma Beto Marubo, membro da Organização Representativa dos Povos Indígenas da Terra do Vale do Javari. Para ele, a reação da sociedade brasileira a esse conjunto de riscos é "tímida ou mesmo omissa".

"Não por acaso, o presidente da República tem como meta deste ano legislativo aprovar tudo que é nefasto à natureza", diz Marubo. "A comunidade nacional, as pessoas comuns, têm que entrar nessa luta e pressionar as autoridades para que não haja um retrocesso como o que estamos vendo todos os dias no Congresso Nacional."

Fonte: https://mail.google.com/mail/u/0/?tab=rm&ogbl#inbox/FMfcgzGmvLPXfdtLgQhjdrnJcrXmwPMM